sábado, 3 de outubro de 2009

(2009/511) Se Deus for calvinista...



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1. Se houver mesmo Deus, e ele for calvinista, e eu, um “eleito”, assim que eu puser o pé no céu dele, peço pra sair. Não posso permanecer no céu de um Deus calvinista. Não acho justo que uns sejam criados para a perdição e outros sejam criados para a salvação – e às favas, senhores, com todas as racionalizações político-teológicas, já antecipo, antes que me venham apoquentar os ouvidos com intermináveis ladainhas medievais! Acho a eleição um crime. Um Deus calvinista é um Deus que peca! A Paulo, que me adverte a não questionar o Criador, eu diria que, se um dia saí do lodo e da condição de animal, para tornar-me homem, não foi para outra coisa que não descobrir o quanto é cruel e covarde a Natureza, gnose revelada à minha condição humana, de modo que, encontrar-me com a Crueldade em pessoa, com o Pecado em carne e osso, não me fará retornar à condição de bicho, senão que utilizar-me-ei da máxima condição humana para arrostar-lhe em face a verdade que só os homens e as mulheres podem ver: que onde não há igualdade, fraternidade, liberdade, não há humanidade, porque há uma humanidade humana, e há outra humanidade, ainda animalizada, bestificada, carne de vermes e apenas carne de vermes. Desumano Deus, que concebe uma eternidade de homens fritos em óleo – e ainda quer canções! É o requinte da perversão! Num céu desses, não canto. Num céu desses, me mato. E fritar com os outros? Melhor com eles.

2. Mas como tudo isso não passa de projeção nos céus da crueldade de certas almas cristãs, de certas almas doentes, nem se me dá essa mitologia de reis e plebeus, uma teologia de Davi e Urias. Como Natan, arrosto-lhe a maldade na cara. E, se tudo, então, é projeção, projeto meu próprio mito – um amigo na varanda, um companheiro de observação de formigas, de empinar papagaios nos céus de Jerusalém, o único que sabe dos beijos que dou em Bel. E quanto aos maus? Bem, resolvamo-nos quanto a eles aqui e agora, posto que, quanto ao futuro, caminho mais por Eclesiastes mesmo, e já fiz saber essa lei ao meu hipostático amigo.

3. Enquanto "batalho" a batalha de transformar a Teologia acadêmica em ciência de verdade – experimento ensaiar uma espiritualidade cética e mística, de nada saber, um nada saber que interdita tanto a fé quanto a não-fé, e, dado que meu corpo e minha alma exigem um mito de amigo, não me acanho de narrá-lo ao pôr-do-sol, e esperar que a aurora ainda me encontre infantil. Isso – ser adulto na Academia, e criança no coração e na alma... Na minha Academia, meu amigo Deus está na primeira fila, mas ninguém o vê, nem eu, só o imagino ali, sorrindo, enquanto me vê brincando de gente grande.

4. Adeus, deuses-reis! Adeus, deuses-senhores! Adeus, deuses-potentes! Ao menos, reconheço, até minha próxima encruzilhada de dor. Aí – ai! ai! –, enfrentarei a tentação – cederei? – de criar para mim um amigo todo-poderoso que me cure o corpo e me conforte a dor. É duríssima a transição...







OSVALDO LUIZ RIBEIRO

8 comentários:

Anônimo disse...

Critica o Calvinismo, mas com certeza nunca leu "As Institutas".

Se tivesses metade do preparo e temor que Calvino tinha ao fazer a exegese do texto bíblico...

O Calvinismo transformou nações inteiras e produz efeitos até hoje, mais de 500 anos depois!

E o Liberalismo, o que conseguiu? Criar pastores ateus e esvaziar igrejas.

O Liberalismo não transforma ninguém, somente para pior.

Realmente, pensando assim não haverá lugar para você no Céu.

Peroratio disse...

Galante, aí está você de novo. Você e o Liberalismo. Por que você acha que apenas o Liberalismo critica o Calvinismo? Não sou liberal, e todavia, não sou calvinista. Eventualmente Deus seja calvinista, mas, aí, já disse o que penso a respeito.

Mas não se preocupe. Nem o que você ou eu pensamos sobre o que quer que Deus seja muda alguma coisa, muda? Faça, então, o que se considera ser o centro da fé cristã - ame-me com o amor de Cristo. Podes fazê-lo? Então está tudo bem... Mas, se não podes, se minha crítica ofende tanto, talvez não seja apenas eu a ficar de fora da festa celeste, não?

Anônimo disse...

Oswaldo, sua crítica não ofende, pelo contrário.

Se ofende, ofende a Deus!

O amor não significa concordar com o pensamento do outro. Você sabe muito bem disso.

Agora, o que disse é que você antes de criticar Calvino deveria ler as Institutas, coisa que você nunca deve ter feito.

Por isso você ficou ofendido.

Você pode ler as edições que existem em português. Eu tenho a versão em inglês.

Não confunda o Calvinismo de João Calvino com o Escolasticismo Calvinista que veio após ele.

A maioria dos calvinistas mesmo não sabe a diferença.

Um abraço

Peroratio disse...

Que bom que não se ofendeu... é que me indicou o inferno (como hipotese, claro), então julguei...

Mas está tudo bem, amamo-nos todos mutuamente e ninguém vai para o inferno...

Quanto às Institutas, deixarei você em dúvida sobre se as li, e às obras de Agostinho, e as de Justino, e as de Lutero, e os Cânones de Dorth... uma vez que tive minha fase fundamentalista...

Um abraço,

Osvaldo

Anônimo disse...

Prezado Osvaldo;

Foi você mesmo que disse no texto que preferia ir pro Inferno...rs

Quando você se dizia fundamentalista, quer dizer arminiano evangélico?

Porque não vejo sentido em rotular a ortodoxia protestante como fundamentalista.

Peroratio disse...

Eu posso escolher. Você me mandar, não.

:o)

Osvaldo

Anônimo disse...

Osvaldo, só me responda essa questão, por curiosidade:

Quando você se dizia "fundamentalista", quer dizer arminiano evangélico?

Peroratio disse...

Pelo que você pode ver, a única classidicação que fiz foi de mim mesmo, e na forma de me dizer ter sido um fundamentalista há muito tempo.

Com isso quero dizer apenas que fui um evangélico brasileiro típico. Mais é desnecessário dizer.

Um abraço,

Osvaldo.

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