Eu juraria não desejar a ninguém
o que eu não desejo para mim, e eu juraria desejar para todas as pessoas o que
para mim eu desejo. Que nenhuma pessoa sofra o que eu não sofro, e que todas as
pessoas usufruam o que eu usufruo. Que todas as pessoas tenham os mesmos
direitos que eu, as mesmas oportunidades, acesso aos mesmos recursos e os
mesmos benefícios. Eu juraria desejar isso.
Eu juraria levar profundamente a
sério os conteúdos que estudei e aprendi em meu curso de Teologia. Eu juraria
considerar o que eu aprendi em Antropologia. Eu juraria considerar o que eu
aprendi em Sociologia, o que eu aprendi em Psicologia, em História, em
Epistemologia. Eu juraria considerar com toda integridade e honestidade
intelectuais os conteúdos de Ciências Humanas que eu aprendi, refletir sobre
eles, levá-los às suas últimas consequências. Eu juraria tentar ser coerente.
Eu juraria não considerar-me
acima de qualquer pessoa. Nem abaixo.
Eu juraria não considerar minha
religião melhor do que a de ninguém, nem mais certa, nem mais justa, nem mais
legítima. Eu juraria considerar equivalentes todas as religiões, sem
distinções, sem exceções, sem ressalvas, sem reservas. Eu juraria considerar
seriamente que gostar da minha própria religião não exige que eu demonize a
religião de ninguém. E eu não demonizaria a religião de ninguém.
Eu juraria não menosprezar nenhum
dos símbolos religiosos de nenhuma das religiões. Eu juraria conceder às suas
representações do sagrado o mesmo status que concedo às representações do
sagrado de minha religião.
Eu juraria não usar nem
instrumentalizar pessoas. Eu juraria dialogar com elas. Ensiná-las, mas,
eventualmente, aprender com elas. Eu juraria não viver a neurose de reproduzir
nelas as minhas ideais religiosas, nem mesmo disfarçando minhas ideias
religiosas com subterfúgios nada coerentes e muito menos éticos, do tipo: “não
prego religião, prego Jesus”... Não: tanto quanto eu não quero que as pessoas
me convençam de sua própria religião, eu juraria não convencer pessoa alguma
sobre a minha própria religião.
Eu juraria não manipular os
textos sagrados. Nem os textos sagrados de minha religião nem os textos
sagrados das outras religiões. Eu juraria estudá-los com responsabilidade
histórica, responsabilidade crítica, responsabilidade semântica – e, acima de
tudo, eu juraria estudá-los com grave responsabilidade ética. Eu juraria não
usá-los segundo meus interesses, nem mesmo que meus interesses me pareçam bons,
éticos e justificáveis. Eu juraria apenas e tão somente consumir minha vida em
tentar compreendê-los enquanto expressão histórica, de pessoas históricas, com
intenções históricas. Eventualmente boas, eventualmente más...
Eu juraria não colocar pessoa
alguma abaixo de meus símbolos religiosos, sejam quais pessoas forem, sejam
quais símbolos forem. Eu juraria não pôr pessoa alguma abaixo de nenhuma
doutrina. Eu juraria não pôr pessoa alguma abaixo dos textos sagrados, pessoa
alguma abaixo da igreja, abaixo das tradições, abaixo das liturgias, abaixo do
sagrado. Eu juraria considerar realmente, verdadeiramente, seriamente, que, no
norte ou no sul, próxima ou distante, pessoa alguma no planeta tenha sido feita
para qualquer item ou aspecto do conjunto de minha fé religiosa. Antes, eu juraria considerar que tudo que diz
respeito à minha fé religiosa é que foi feito para toda e qualquer pessoa, de
sorte que as pessoas são infinitamente superiores, mais importantes e mais
relevantes do que qualquer coisa que eu possa nomear no conjunto de minha fé.
Ao lado de uma pessoa, tudo o mais é sábado. No mundo, só há pessoas e
sábados...
De sorte que eu juraria não
alimentar nem fomentar nenhum tipo de preconceito. Nenhum. Eu juraria não
tolerar nem promover preconceitos de cor, de religião, de sexo, de classe
social, de gênero, de cultura, de etnia. Eu juraria dedicar a minha vida a
promover a liberdade, a igualdade e a fraternidade. Eu juraria abominar com
todas as minhas forças o racismo, a misoginia e a homofobia. E eu juraria
investigar minha consciência e valores, a fim de questionar-me quanto à possibilidade
da manutenção de preconceitos disfarçados em virtudes, verdades e valores que,
no fundo, não passam de perversão religiosa.
Finalmente, eu juraria nunca
considerar ter chegado ao fim de minha caminhada de aprendizado. Eu juraria
considerar que sempre posso estar errado. Em tudo. Eu juraria sempre retornar
aos fundamentos de meus valores, de meus conhecimentos e de minha fé, e outra
vez submetê-los às severas provas e riscos da crítica. Porque eu juraria
esforçar-me a ser uma pessoa boa, e muitas vezes, julgando-nos bons, somos os
mais perversos dos seres humanos...
Eu juraria tentar ser um bom
teólogo, fazendo do exercício da minha teologia e profissão o exercício da
cidadania, da solidariedade, do acolhimento e da responsabilidade.
Alguém, eventualmente, me
cobraria a falta de uma citação bíblica nesse juramento que eventualmente eu
fizesse. Nesse caso, ponderadamente, eu o encerraria com a sempre
desconcertante recomendação de Eclesiastes: “tudo quanto te vier à mão para
fazer, faze-o conforme as tuas forças, porque na sepultura, para onde tu vais,
não há obra, nem indústria, nem ciência, nem sabedoria alguma” (Ec 9,10).
Porque hoje somos teólogos e teólogas, mas amanhã seremos pó, porque, segundo o
mesmo livro sagrado, do pó viemos, e ao pó voltaremos todos nós...
(Meu discurso paraninfal na formatura da turma 2015 de Teologia, da Faculdade Unida de Vitória, 10/12/2015. Não representa necessariamente o pensamento do corpo docente nem da Faculdade. Representa meu pensamento, enquanto teólogo e cidadão).
OSVALDO LUIZ RIBEIRO
Nenhum comentário:
Postar um comentário