segunda-feira, 20 de maio de 2013

(2013/538) Religião e pensamento


1. A religião, qualquer que seja ela, não foi feita para ser pensada. O pensamento a respeito da coisa não faz parte do programa da religião. Quem a inventou, sequer pensou em se pensar sobre ela, em se pensar ali...

2. Religião é uma espécie de jogo que se joga sem pensar: é como tocar um instrumento - automatiza-se, ao ponto de se fazer sem pensar. 

3. Nada mais diferente da religião do que uma equação: a equação exige que você reflita, analise, faça contas. A religião, não: exige apenas a entrega paciente e pacífica a seu modo de ser, ao seu jogo, a suas injunções - em troca do que ela lhe garante a satisfação que ela prometeu e que você foi buscar nela.

4. A religião, todavia, foi inventada por homens. Os homens, a seu tempo, inventaram a reflexão, o pensamento analítico, a crítica. Coisas de homens, religião e pensamento, todavia, não convivem bem.

5. Quando as primeiras religiões tiveram de acomodar as reflexões, fizeram-no por meio da acomodação do pensamento a si mesmas: pensar, aí, torna-se, necessariamente, pensar a partir daí, repetir as regras do jogo, justificá-las. Só. Mais nada.

6. Quando, todavia, o pensamento se torna independente, não tem alternativa: a religião se dissolve, porque não suporta o pensamento, a alternativa: religião não conhece mundos possíveis que não ela mesma...

7. Por isso, quando o pensamento se dirige à religião, das duas uma, será para dissolvê-la ou para ser dissolvido. Quando você julga que o pensamento convive com a religião, não se engane: não é mais pensamento, mas acomodação cansada de uma mente desgastada a um jogo contra o qual ele, mariposa, desgastou-se em investidas...

8. Não há acomodação possível entre religião e pensamento: só a capitulação de um diante do outro. 





OSVALDO LUIZ RIBEIRO

2 comentários:

Al disse...

Pensamento, você diz, no sentido de racionalidade?

Ponho a questão por supor não serem idênticos.

O pensamento acontece exatamente quando as regras habituais que regulam o bom senso e a razão são violentados pelos elementos estranhos do real, e a mente terá que reagir a isso.

Racionalização é a capitulação do real por regras muito bem claras e supostas, como por exemplo, o método científico.

Ou seja, é possível inclusive que a racionalização tutele o pensamento e o transforme em mera recognição do mesmo.

Caso seja no sentido de racionalização,acho vc tem toda razão.

Peroratio disse...

No texto, penamento é a reflexão crítica.

Para racionalidade e racionalização, uso os termos de Morin:

a) racionalidade - diálogo crítico recursivo entre discurso e real;

b) racionalização - pensamento constituído por axiomas não-ecodependentes, voltados para sua auto-referência e sem contato com o real

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