sexta-feira, 10 de agosto de 2012

(2012/608) Das teologias que se podem fazer - e da neurose do teólogo de último tipo


1. Tudo bem, vamos lá...

2. Há quem faça teologia para e pensando em "Deus". Esse teólogo tem de si a idéia de alguém que pode, de um jeito ou de outro, no pouco, muito pouco, ou no muito, saber e dizer algo sobre "Deus". Para ele, ele pode pensar "Deus", dizer "Deus" e, naturalmente, ensiná-lo.

3. Há teólogos de toda sorte nesse grupo - desde o mais renhido fundamentalista até o mais pluralista dos ecumênicos - o critério aqui é unicamente o fato de acreditarem que há algo de "Deus" em suas crenças e palavras...

4. Não posso ouvir nenhum desses teólogos. Respeito-os, defenderei o direito de fazerem sua teologia, mas sou radicalmente surdo para eles e seus discursos. Posso ser amigo deles, mas não posso ouvir sua teologia. Não se ouvir é encontrar sentido nela. Conquanto entenda que eles encontrem...

5. Há outro tipo de teólogo: o político. Ele faz teologia pensando na e para a igreja. Teologia, para ele, é uma forma de controlar, para o bem ou para o mal, as ovelhas. Não se trata tanto - se é que se trata - de "Deus": se trata de como as ovelhas vão se comportar...

6. Também há teólogos de toda sorte nesse grupo: há aqueles charlatões que não acreditam absolutamente em nada do que dizem e fazem, só querem mesmo é a carne e a lã das ovelhas, e há aqueles "politicamente corretos", auto-tidos como libertários, que pensam poder usar as palavras, como metáforas, para a libertação das pessoas... Os primeiros sabem que são canalhas. Os segundos se julgam "pastorais".

7. Também não estou muito à vontade com eles. Os do primeiro tipo dessa categoria, para mim a polícia devia fazer-lhes uma visita: não haveria juiz suficiente para assinar mandado de prisão. Quanto aos do segundo tipo, tenho desconfianças e reservas, porque eu não acredito que mitos sejam libertários: mitos podem ser "confortantes", mas libertários, nunca! E acho, até, que, no fundo, eles sabem disso.

8. Finalmente, acho que há um terceiro tipo de teólogo, aquele que quer apenas saber o que realmente é a teologia que se faz, onde quer que se faça, seja quem for que a faça, que trata doutrinas, textos, mitos, crenças, prédicas, todos os discursos religiosos, como produto humano e que, por isso, quer entender não só esse produto humano em si, mas a própria engrenagem onde eles ocupam o papel de "dente".

9. Acho que há dois tipos de teólogos assim: os profissionais e os neuróticos. Os profissionais podem fazer esse tipo de teologia entre as 8 e as 17 horas e, antes e depois, enfiar-se em qualquer outro modo de teologia. Ele é profissional: sabe fazer a coisa acontecer do modo acadêmico - mas ele mesmo, a sua alma, não o é. Ele é um crente até a próstata. O segundo tipo é um neurótico: o que ele faz enquanto acadêmico é o que ele faz o dia todo, onde quer que esteja, é assim que ele pensa, é assim que ele vive, é assim que ele é.

10. Se alguém me perguntar qual desses eu sou, respondo que me parece bem óbvio: o neurótico. 



OSVALDO LUIZ RIBEIRO

2 comentários:

Unknown disse...

Este grupo de teólogos ("que querem apenas saber o que realmente é a teologia que se faz, onde quer que se faça, seja quem for que a faça, que trata doutrinas, textos, mitos, crenças, prédicas, todos os discursos religiosos, como produto humano e que, por isso, quer entender não só esse produto humano em si...")seria um cientista da religião então? Haveria, desta forma, diferença entre ciências das religiões e teologia?

Peroratio disse...

Miguel, sim e não.
Sim, na prática, hoje, essa é basicamente a diferença entre teologia e ciências das religiões: um olha de fora, o cientista da religião, e o outro, de dentro, o teólogo...
Não, eu prefiro acreditar (ainda) que a teologia pode definitivamente arrancar suas asas de anjo e encarnar de verdade, e não de mentirinha, como fez até hoje.
O tempo dirá...

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