1. O sacerdote olha a platéia que tem diante de si - um mar de olhos arregalados, de sufocamentos da alma, de corações a galope, de veias e artérias comprimidas, com esgares nas caras de horror e medo. E ele há de estragar tudo.
2. O inferno, os castigos da alma, isso lá não são coisas de que se descuidar. Pelo contrário! Todas as disciplinas da alma e do corpo devem ser convocadas para o enfrentamento desse destino terrível - crer na alma, crer em Deus, crer na salvação. E ele há de estragar tudo.
3. Ele abre as Escrituras. A respiração da platéia cessa. Ouve-se o chiar das lâmpadas, de outro modo, silenciosas. Um cão uiva na rua. Uma sirene ao longe... E ele lê: Nosso Deus e Salvador, que quer que todos os homens se salvem e venham ao conhecimento da verdade...
4. Ah, o que Deus quer! Como nos ama! E todos soltam a respiração prendida, e fitam o sacerdote, que os fita a todos. O que Deus quer, meus pequeninos? E eles, automaticamente, respondem, ciosos do desejo e coração de Deus : que todos os homens se salvem...
5. Amém!, todos dizem - e querem. O sacerdote permanece imóvel por algum tempo. A ansiedade toma conta da platéia. E, então, passados alguns longos, muito longos, segundos, ele lê: reconheço que nenhum dos teus pensamentos pode ser impedido...
6. Não sabemos como a história terminou. Há uns que dizem que a platéia fez as contas, viu que, no final das contas, nada pode impedir que Deus salve a todos, porque é isso que ele quer e deseja, fecharam as portas do templo, e foram cuidar da vida. Outros, porém, dizem que o sacerdote foi demitido, acusado de não saber usar a Bíblia e de ensinar heresias. Nunca saberemos o que de fato aconteceu naquele dia, depois que o sacerdote leu 2 Tm 2,4 e Jó 42,1. A única coisa segura é que nunca mais se pregou isso e assim naquele templo.
OSVALDO LUIZ RIBEIRO
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