Os humanos inventaram a família. No início, poligâmica - o homem devia passar o dia todo lutando contra outros machos, para defender suas fêmeas-propriedades, exatamente como fazem os demais primatas.
Por algum motivo e em algum momento, inventamos a monogamia. A família era de um jeito, inventamos um novo e vamos inventar outros - como já se inventam os modelos não papai-mamãe, comuns nas sociedades democráticas, que não as inventaram, mas pararam de perseguir e matar pessoas homoafetivas.
Os humanos inventaram modos de comer. Começamos coletando comida na floresta, caçando. Os deuses davam. Depois, passamos a plantar e a criar animais, e inventamos de dizer que os deuses eram férteis e abençoavam a plantação e os bichos.
Os humanos inventaram a religião. Por todo o tempo, elas foram selvagens. Por volta de 500 a.C., uma onda moralizante varreu o mundo - Zoroastro, Confúcio, Lao-Tsé. Os deuses, pouco a pouco, sucumbiram ao controle moral.
Vivemos os dias da transformação da religião. Ela me parece a última experiência profunda humana a sofrer transformação. Está em agonia de parto há 2,5 mil anos, e ainda falta muito para transformar-se.
Se querem entender o que eu acho que faço? Antecipar os movimentos de transformação da religião: escrever, hoje, como se ela já tivesse mais perto de ser o que virá a ser, ainda que ela ainda esteja muito mais próxima do que sempre foi.
Mas não se engane: o fato de você achar que Deus pode fazer certas coisas, mas não outras - matar inocentes, por exemplo - é prova de que a religião já está se transformando dentro de você, mas resiste, faz força, não quer.
Como os humanos, os sistemas culturais humanos também acomodam-se: depois de instalados, lutam para permanecer como são, como estão.
A despeito do tempo.
Porque, quer você queira, quer não, o novo sempre vem.
OSVALDO LUIZ RIBEIRO
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