sábado, 23 de março de 2013

(2013/332) Mandrágora, a raiz que o diabo tomou de Deus

1. Mandrágoras são mencionadas no Antigo Testamento em apenas duas passagens. Em Gênesis 30,14, numa passagem que guarda a memória da relação da mandrágora com sexo e procriação (afrodisíaco). Ruben encontra mandrágoras no campo e as leva a Lea, sua mãe. Raquel quer as raízes e as pede. Depois de uma desavença, Raquel permite que sua noite com Jacó, marido de ambas, seja passada para Lea que, deitando-se com o marido, engravida. A história pretende fazer supor que Lea não tenha dado todas as raízes a Raquel, mas que tenha reservado uma parte para fazer ela mesma, para si, uma poção que, tendo tomado, facilitará sua gravidez, como, de fato, ocorre. Issacar nascerá daquele encontro.

2. A outra passagem se dá no livro de Cantares de Salomão 7,13. A Amada diz ao amado que as mandrágoras exalam seu perfume - e, então, o condia para uma passeio erótico pelos campos... Lá, ela diz, lá te darei o meu amor... Em Hebraico, mandrágora, meu amor e fazer amor são todos termos aparentados...

3. A tradição ortodoxa sacerdotal/sinagogal judaíta há de ficar superlativamente contrariada com essas tradições, as quais aproxima as mulheres da órbita perigosa, segundo sua cartilha, da magia. Todavia, as mulheres têm em sua Mãe - Lea - a garantia da "ortopraxia" de colher as raízes e preparar as poções e a "ortodoxia" de usar as raízes. É preciso, pois, interditar essa memória. Assim, no Testamento dos Doze Patriarcas, literatura judaíta tratada "apócrifa" em relação ao cânon da Bíblia Hebraica, altera um pouco as coisas... Não foram mandrágoras mais: foram "tomates". Eles ensinarão que foram os demônios que entregaram às mulheres a sabedoria do uso das poções, das mandrágoras: o que fora de Deus, o diabo tomou...

4. Curioso é notar que na Bíblia Hebraica da Editora Sefer, publicada no Brasil em 2006, Gorodovits e Fridlin tenham optado por contar que Ruben tenha encontrado... jasmins... Mas não foram nem jasmins nem tomates - a despeito de todo constrangimento ortodoxo judaico: foram mandrágoras, mandrágoras, mandrágoras...




 

5. Mandrágora. Cuido haver quatro espécies "principais" de mandrágoras: Mandragora autumnalis, Mandragora officinarum, Mandragora turcomanica e Mandragora caulescens. Todavia, encontrei referências a pelo menos sete tipos de sementes:







 
 
 
 

7. Mandragora autumnalis - a mandrágora de Gn 30,14 e Ct 7,13











Duas abelhas lambuzando-se na flor de mandrágora em pleno Vale de Armagedon


  

8. Mandragora turcomanica




 






10. Diversas tradições medievais se desenvolveram e uma das mais comuns, aparecendo em diversas gravuras, é a que afirma que a mandrágora deve ser colhida por meio de um cão preto, caso contrário ela gritará tão forte que matará quem tentar colhê-la, tradição recolhida na cena das mandrágoras de Harry Potter.





 





OSVALDO LUIZ RIBEIRO
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