1. Não me recordo de um "crítico" do sistema que tenha sido bem sucedido, salvo Lutero.
2. Huss assou na fogueira. Jesus foi crucificado.
3. Lutero não foi nem uma coisa nem outra - e por quê?
4. Porque teve a seu lado o que nem Huss nem Jesus tiveram - os poderosos. Não vou reduzir a Reforma aos príncipes germânicos e do norte, mas a Reforma não seria nada sem eles, um punhado de ideias useiras e vezeiras, mas sem sustentação política e militar.
5. Jesus não tinha um soldado a seu lado - quiçá, eu apostaria nisso, um grupelho de revolucionários judeus, que não encheria um canto de Massada, cujo destino foi o mesmo, ainda que pelas próprias mãos. Roma, meus caros, Roma... A Águia bateu as asas e Pedro tremeu como vara verde, se posso crer na tradição...
5. Huss não tinha soldados, só seu amigo bem maior e que, por isso, cozeu por muito mais tempo e à custa de muito mais dor e gritos de agonia...
6. Lutero não só venceu Roma - também pisou camponeses. Porque teve a seu lado o poder, e não falo do poder menor e teatral de púlpitos: falo do poder das armas...
7. Lutero é um caso atípico - um golpe para dentro, uma derrubada para cima, uma tomada de poder pelo poder. Está longe de ser uma "revolução" - conquanto, naturalmente, nem de longe se suspeitassem das consequências que o golpe teria e teve...
8. Assim, é curioso ver a batalha "dentro" da Igreja. Pequenas batalhas, sem qualquer possibilidade de alterar um móvel de lugar, esfacelado que está o tecido cristão e, quanto ainda mais?, o evangélico.
9. Mas há, ainda, em nós, aquela síndrome do "Reino". Cada um de nós se julga um soldado direto de Deus, a lutar pelo "Reino". Não temos a consciência do grão que é cada igreja - temos, ainda, o mito da "cristandade", nós versus os outros. Não é que não aprendemos nada com a História - nós nem sabemos o que ela é!
10. Quando um evangélico fala para além das paredes de seu templo, fico a pensar que consciência se tem, aí, do esfacelamento evangélico. Cada um de nós é uma Roma, cada templo, um Vaticano, cada palavra, do próprio Deus, sem a consciência de sua insignificância no incontrolável jogo dos pequenos e mesquinhos poderes eclesiásticos - galos a cantar, cuidando, com isso, erguer o sol...
11. Cada um de nós ainda acha que seu campo é o mundo, que seus ouvintes são todos, que seu projeto é o Planeta, que sua audiência é a humanidade.
12. E não é.
13. Perdida, pois, a batalha contra nosso equívoco pessoal, resta-nos ser forçados a fazer o que era nosso destino desde sempre - recolhermo-nos ao nosso espaço, ao nosso meio metro quadrado, que é onde a religião deve se expressar, se o jogo é republicano.
14. E transparece como martírio o que é destino.
15. Porque, no mundo, no jogo do mundo, não haverá sucesso algum - de nenhuma natureza - se o jogo e as armas não forem o jogo e as armas do mundo.
16. Olhe lá na frente o sucesso: eis nele a etiqueta: made in mundo...
17. E se se trata do jogo do mundo, deixemos a religião e nos candidatemos a cargos públicos - porque é lá, e só lá, no presente jogo do mundo, onde as transformações, de fato, vão ser elaboradas ou não.
18. Nas pequenas confrarias megalomaníacas dos templos, apenas catarse.
19. Salvo se - e somente se (e disso tenho medo), se, fingindo-se religião, a coisa toda transformar-se em política, e a massa de santos converterem-se em votos para a Nova Reforma.
20. Aí, senhores, o jogo do mundo terá vencido.
21. Mais uma vez...
OSVALDO LUIZ RIBEIRO
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