terça-feira, 28 de junho de 2011

(2011/403) Sobre "certa" leitura popular da Bíblia



1. Ah, corrigir trabalhos... Que trabalho que dá! Principalmente se você os lê - e, em época de produção de plágio em escala, ou você lê, ou é tratado como bobo pelos corredores... Então, bunda na cadeira, com o perdão da palavra... As costas é que reclamam horrores!

2. Um dos textos que se devia ler era sobre "leitura popular da Bíblia". Curiosos os argumentos para se pôr a Bíblia na mão do povo: eles têm o direito de ler! Não se pode privar o povo de sua leitura! O povo é sujeito histórico de leitura! Os acadêmicos - imperialistas eurocêntricos! - querem dominar, querem exercer poder e controle sobre as leituras! Abaixo o imperialismo! Abaixo esses devoradores da liberdade de produção de sentido! E por aí vai...

3. Ai! Ai! Lembram-se do caso do Césio-137 em Goiânia? Alguém largou inadvertida e irresponsavelmente, um aparelho hospitalar que continha Césio-137. Um popular cismou de pegar o aparelho, levar pra casa, abrir, divertir-se com a "tinta" verde-amarelada, distribuir com a meninada, lambuzar a mão, o rosto, pra ver brilhar. Uma desgraça. Uma tragédia. Um acidente nível 5 na Escala Internacional de Acidentes Nucleares. Mortos e feridos. Desgraça. Tragédia.

4. Não estou defendendo que o povo não tenha acesso à Bíblia. Tolice, e, quem me ler desse modo, lê errado, e vá produzir sentido em outra freguesia. O que estou dizendo é que a Bíblia precisa ser lida com sabedoria, técnica, método, inteligência, prudência. Como qualquer instrumento, é preciso saber usar. Caso contrário - mortos e feridos, desgraça, tragédia. Se o povo não "aprende" a ler, vai ler de qualquer jeito, como quem brinca com Césio-137...

5. No fundo, no fundo, todavia, não acredito que a "leitura popular" deixe de verdade a Bíblia "na mão do povo" - há, sempre, lá, um agente de leitura, um orientador, um ativista, a produzir leitura comunitária, e a tratar tal coisa como "leitura popular da Bíblia". Ressinto-me mais profundamente pelo fato de que as técnicas são, em termos históricos, de desleitura, ops!, releitura, de engajamento retórico-ideológico aplicado sobre antigas alegorias, ontem, de direita, hoje, de esquerda...

6. O quadro me parece de "animação", no sentido de dar direção e ânimo para as comunidades. Mas, alto lá!, sempre sob a "supervisão" explicitamente ideológica de intelectuais orgânicos. Sim, refiro-me explicitamente a Gramsci. O que considero chato disso é que um processo assim, tão claramente orientado desde cima, como que desde baixo, apresente-se como uma coisa que não é. : leitura popular. Não deveria ser "leitura para populares"?

7. Exagero na dose? Não seria novidade, seria?






OSVALDO LUIZ RIBEIRO

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