quinta-feira, 10 de março de 2011

(2011/156) Do que é a Teologia e do que ela poderia vir a ser


1. No coração da Teologia está um conjunto de concepções pré-assumidas - teologicamente indiscutíveis, quero dizer: se você discuti-las, para os teólogos, acabou a Teologia. Isso quer dizer que a Teologia, tal qual ela é, ainda, circunscreve-se a um jogo muito particular, com regras próprias que, se não respeitadas, desmontam a Teologia em sua auto-compreensão - a julgar pela sua própria auto-compreensão epistemológica.

2. São partes dessas regras indiscutíveis: a disjunção céu - terra, mente - corpo, espírito - matéria, homem - deus(es), conhecimento humano - conhecimento divino. Numa perspectiva científico-humanista - sim, aquelas disciplinas que estão no próprio currículo da Teologia! (precisa falar mais o quê?) - estamos, aí, diante de construções histórico-sociais, político-religiosas, mitos internos à epistemologia teológica.

3. Teologia, então, é o que se faz aí dentro, a partir dessas prerrogativas indiscutíveis. Mesmo os "manuais" de Ciências da Religião, quando trazem pronunciamentos da "Teologia", apresentam-na justamente como isso mesmo: pronunciamento no plano de Deus. As Ciências Humanas sabem o que se quer dizer com isso - mas nas Ciências da Religião, ainda fortemente instrumentalizadas pela Teologia, o que a Teologia diz é isso mesmo que quer dizer quando diz o que tem a dizer.

4. Eu penso que a Teologia deveria dar um passo atrás e subir um degrau a mais - de modo a ampliar o seu campo visual. Ela deveria incluir-se a si mesma, criticar-se a si mesma - coisa que não faz, e, quando o faz, o faz no nível do dogma ou do jogo epistemológico clássico: vício de método.

5. A Teologia deveria passar a ser o olhar sobre a própria relação do homem com as suas idéias de sagrado, incluídos aí todos os desdobramentos político, sociais, artísticos, classificando cada operação interna de seu objeto mais amplo a partir das informações advindas das pesquisas do conjunto das ciências, inclusive as naturais.

6. Todavia, o esforço inteiro da plataforma teológica é no sentido de não arredar pé de sua posição, de não abandonar seu discurso, sua prática, seu modo de ser.

7. Para ser franco, a única coisa que a difere de Papai Noel é que, quando crescem, as crianças são ensinadas a perceber que tudo aquilo era uma encenação lúdica, ao passo que, quando crescemos, é aí que nos querem fazer acreditar que as coisas, aí, não são como lá.

8. Chegará o dia em que teremos um profundo sentimento de constrangimento, de vergonha, de nós mesmos? Ou viveremos, ainda, longos séculos de racionalização disfuncional da plataforma de discurso que, quando empregados por nós, é lucidez, mas quando outros operam, é infantilidade cultural? Ou, cá entre nós, aceitamos mesmo a existência de deuses, como o querem os politeístas? Ah, mas "um", nesse caso, é bastante "racional", não é verdade?


OSVALDO LUIZ RIBEIRO

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