No monoteísmo, cada vez que alguém reputa a Deus uma coisa boa que lhe tenha acontecido, imediatamente fica pressuposto que há, aí, uma discriminação: ele ganha uma boa o esposa, o outro, não; ele ganha uma casa, o outro, não; ele ganha um emprego, e outro, não; ele tem saúde, o outro, não; ele não morreu no acidente, o outro, sim; seus filhos nasceram com saúde, os dos outros, não etc.
Ainda que pressuposto, não era a intenção do agradecido comportar-se como um egoísta - mas ele acaba aparecendo aos olhos de todos como um agradecido egoísta, o que não é pior do que o modo como o próprio Deus monoteísta acaba aparecendo na mesma foto: um Deus que discrimina pessoas, que trata a cada um de forma diferente, a despeito das dores iguais de todos.
Não há saída para isso, senão o cinismo calvinista ou a embromação de "mistério" dos confessionais que se recusam a encarar a realidade: uma vez que a vida que os homens construíram é discriminatória e injusta, reputar cada pedaço dela ao mesmo Deus é projetar nele essa mesma discriminação e injustiça.
OSVALDO LUIZ RIBEIRO
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