1. Felipe Fialho foi nosso aluno na Faculdade Unida de Vitória, nosso, eu digo, porque meu e de meus colegas (usar nosso quando se refere a "eu" soa-me de mau gosto, e não foi o caso). Está me matrícula trancada, depois de um curso de Hebraico, em Jerusalém... Inveja. Brasileiro, em Jerusalém, aprendendo Hebraico, em inglês - é um poliglota!
2. Escrevi um texto agora há pouco (post anterior). Felipe comentou.
Às vezes fico me perguntando a razão de o professor Osvaldo Luiz Ribeiro tocar tanto nas nossas dúvidas e feridas já existentes... A verdade liberta e nos lança num abismo de não-saber e não-querer-ter-certeza das coisas, cabendo-nos apenas reconhecer que vivemos no caos, e nenhuma verdade pode imperar sobre o silêncio.
3. É, meu caro Felipe, essa é uma questão inquietante. Talvez seja um caso de vocação e de "pro"vocação. Acho que tenho uma vocação para o desassossegamento. Talvez seja uma veia pedagógica hipercrítica. A alguém cabe ir lá e pôr os tijolos, fazer a "catequese" dos conteúdos. A mim, eu acho, parece caber a crítica dos tijolos.
4. Crítica não é maledicência. De maledicência, a fé está cheia - não há igreja que não fale mal de outra. Isso é maledicência. Aqui, falo de crítica. E o que é crítica?
5. Imagine um muro. Ele tem o fundamento, enterrado no chão. Tem as vigas. Tem os tijolos. Crítica é testar o muro, para ver se ele está seguro. Aí, não adianta bater no tijolo - vai quebrar, mas o muro em si não estará testado.
6. Você, então, se quer saber se o muro corre o risco de cair em cima de uma criança e causar uma tragédia, testa antes - como se faz com as pontes, antes de inaugurá-las. Então, você só pode bater - e terá de bater - num ponto: o fundamento, o alicerce.
7. Bate umas duas vezes com uma boa sexta-feira. O muro deve tremer todo - mas não pode cair. Se tiver que cair, caia agora. Estava podre, mal construído, inseguro - caia, então. Faz-se outro. Se resistir, será um bom muro.
8. Isso é crítica.
9. Acho que quanto mais cedo um professor começa a ensinar, para crianças, por exemplo, mais conteúdo deve dar e menos crítica, mas com tons já de insinuações preparatórias. À medida que o educando ganha idade, a crítica deve se sobrepôr aos conteúdos - porque a educação deve ser educação para a autonomia, para a liberdade, para a problematização.
10. Educação não é cabresto. Até pode ser. Na igreja, é - qualquer que seja ela: cabresto. Metáfora pesada, eu reconheço, mas não é culpa da linguagem...
11. Aí, Felipe, quando um crente se depara com dinâmicas pedagógicas comprometidas com os valores da emancipação epistemológica, da autonomia, ele "pira", porque não tem estrutura. Correrá para a saia do padre/pastor. Conclamará por inquisições. Evocará mil doutrinas e dogmas. Culpa de quem? Da educação que ele teve. Mas quem é a vítima?
12. Eu acho que eu exagero na dose. Reconheço. Sou hiperbólico, é fato. Todavia, procuro tratar meus educandos - adultos! - como cidadãos, com direito às informações, à formação. E serei, sempre, crítico - ou abandono a cátedra.
13. O educando terá sempre o direito de recusar meu discurso, rechaçá-lo, e retornar para seu mundo doutrinário: quantos já não o fizeram?! Nunca os obrigo a me darem razão. Nesse caso, sentirá alguma dor pela exposição às críticas que foi "obrigado" a ouvir. Mas, acredite, essas dores nada são perto do estrago que lhe fizeram na alma - e disso ele sequer tem conhecimento...
14. Expliquei?
15. Agora vai lá catar os cacos que a vida dói.
16. Falar nisso, já assistiu a um parto natural. Devia. Todo aluno devia assistir a um parto natural. O mundo nos recebe assim, com sangue, dor e gritos. E só se cresce assim, com sangue, dor e gritos. E é por isso que a Educação Religiosa nas Igrejas é a mesma há cem anos: porque ali só se quer aleluias, palminhas e auto-ajuda evangélica. É de direito. Mas não promove autonomia não...
OSVALDO LUIZ RIBEIRO
PS. Felipe, acredite: não tenho certeza de fazer a coisa certa. Só me parece, pelo menos, melhor do que a alternativa...
5 comentários:
O problema, professor, é que dói demais, e quando se é crítico na solidão, rodeado de pessoas que falam que você está "pecando contra Deus", sendo rebelde e tudo isso, a crise fica pior, e não mais se sabe o que fazer... Se o problema fossem as pessoas, mando todas catar coquinho, mas elas me jogam na parede e falam "se vire com Deus"! Ai dói pra caramba. Por outra parte, não posso nem quero voltar ao que eu era. Teria que desligar o cérebro.
Dói tanto mais quanto maior for sua dependência da comunidade, da aceitação, porque a comunidade exige que você se encaixe.
Nisso está minha maior crueldade. Socialmente, basta-me muito pouca coisa: Bel, meus filhos, um ou dois amigos.
Aí, com o tempo, a dor vai passando, e tornando-se um ruído de fundo: sempre lá, mas, às vezes, você esquece.
Acho que cada um lidará com a crise de modo próprio.
A única segurança é pedir a Deus que não se seja uma daquelas pessoas que se deixa encantar pela crítica (o que é que digo?!). Uma vez que se é fisgado por ela, não há retorno.
O que me instiga a pesquisa hoje é: porque uns se deixam fisgar, outros não? Que mecanismo faz com que esse abandone a visão dogmática, aquele, não?
Hoje, não sei. Não é algo na mensagem em si, posto que, se fosse a mensagem em si a responsável pela ação de quem a ouve, a reação seria a mesma.
Tem de ser, então, algo em nós mesmo - algo do tipo: sempre esperei ouvir isso. Algo como se fosse o encontro de um eu que a gente tinha dentro de nós, mas não sabia, e que acaba de despertar, com o pousar de passarinho...
Para quem iremos, Osvaldo? kkk
Abraços
Tenho sido repetitivo. A Modernidade me incomoda. Incomoda mesmo. É latente. Mas não um incômodo daqueles que se perde o sono e no outro dia as coisas vão se encaixando. Perco o sono porque sei que no dia seguinte as peças não encontrarão mais lugar de encaixe. As tantas convicções de outrora vão sendo testadas e criticadas pelo fato, pela história, pelo jogo das comparações sem intermitências. Não dá descanso. Esse incômodo é uma libertação dorida. Extremamente dorida. Tenho aprendido que não há tratamento. Talvez o tratamento seja o retorno à estrutura puída. Essa é uma das respostas porque muitos não cedem ao pensamento moderno.
Fui (des)conquistado, (des)encantado. E qual o progresso? Um melhor trato com o “Deus desconhecido”. Não um lugar como de Atenas, onde qualquer um pode subir e dar o seu xeque-mate, como Paulo – o oportunista. Não, definitivamente. Mas um altar onde subo e digo que é desconhecido porque é desconhecido mesmo. Ainda que eu creia no Jesus que me modificou o âmago, não teria a capacidade de biografá-lo. Deus sempre será surpreendente, o causador tanto do temor como do fascínio! Sei que minha reação diante dEle seria apenas um suspiro. Nada além.
Sinto que os dogmas – mesmo que ainda muito vivos – vão sendo extraídos, pouco a pouco. A realidade abate!
Quero confessar: a Bíblia por mim já fora usada a fim de promover o exame particular, feito no quarto. Desejei ardentemente que todos lessem a partir de minhas perspectivas, de minha formação teológica, de minha simples vivência devocional. Confesso que já interpretei com os olhos de um crente fervoroso, e não com olhos de um ser humano inclinado a amar como Jesus amou. Confesso que já desejei morrer pelos meus erros e ensinei isso, mas nunca aprender com os mesmos e situá-los na caminhada do crescimento. Confesso que tudo isso aqui ainda é coração e no dia em que eu aprender a conjugar paixão e crítica, aprendi o quanto é (ou foi) arriscado viver.
(Extraído de http://nelsonlellis.blogspot.com/2012/02/as-crises-da-modernidade.html)
Lelis, fiz-se fundamentalista dispensacionalista assim que me vi crente, em 1984. Evangelizava de porta em porta. Lia com meus olhos e considerava que todos deviam fazer assim e, quem não fizesse, estava errado. Conheço os mecanismos internos dessa self deception. Quando batia de porta em porta, minha educação de respeito aos mais velhos gritava, meu recato, gritava, mas aquelas ordens dadas pela catequese me faziam passar por cima de mim mesmo. Aí, bateu-me hebraico às mãos, teologia, Bíblia... pronto. Sei exatamente do que você está falando.
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