segunda-feira, 7 de setembro de 2009

(2009/454) Da apatia


1. 1965. "Não há o mínimo temor de uma revolta espontânea do povo o mais apático, o mais resignado à miséria que existe no mundo". Isso o disse - escreveu! - "em 7 de abril de 1965, um ano após o golpe militar que destituiu o presidente João Goulart, o embaixador da França no Brasil, Pierre Sebilleau, (...) em seu relatório enviado ao Ministério da Relações Exteriores, em Paris". Lá se vão 44 anos.

2. O mais do mundo? Não sei. Mas que somos politicamente acomodados, apáticos - somos. No entanto, não foi apenas aqui que tivemos regime de exceção. Toda a América Latina e boas porções do Caribe, mas, também, Portugual e Espanha. Uma Alemanha inteira assistiu ao Nazismo quase que de camarote, o mesmo fazendo toda uma Itália em relação ao fascismo... A China e a Coréia do Norte vivem regimes autoritários há décadas. Sim, nós, brasileiros, acomodamo-nos aos regimes políticos. Mas não estamos sós nessa empreitada.

3. No entanto, essa constatação de que temos companhia não nos ajuda muito. Pelo contrário - termino o post chegando até a considerar que, afinal, não é nada de tão patológico assim acomodar-se... Com o que, mais uma vez, engordo a fila dos ajustados...


OSVALDO LUIZ RIBEIRO

5 comentários:

João Oliveira Ramos Neto disse...

O fato de que outras nações também são acomodadas não significa que acomodar-se não seja patológico. Afinal, maioria não é sinônimo de saúde. Além da grande Hanna Arendt, cito Alcir Lenharo, historiador, que muito bem analisou isso no livro "O Triunfo da Vontade": O mundo inteiro sabia que os judeus estavam morrendo no nazismo, mas ninguém fez nada. Por quê?
Um dos motivos das pessoas aceitarem ditadores é porque, apesar de tirarem a liberdade de expressão, promovem outras coisas que a população gosta e eleva a sua autoestima (ainda que seja falso), principalmente obras públicas.
Já no século I, ninguém reclamou o infanticídio de Herodes, "o grande", já que ele encheu a Judéia de infra-estrutura e reformou o templo de Salomão. Hitler matou os judeus, mas ninguém contestou porque ele reergueu a Alemanha depois da humilhação da Primeira Guerra. E as pessoas acomodavam-se à ditadura no Brasil já que viam tremendas obras, como a Usina de Itaipu, serem construídas. (Ninguém aqui se importa com as conseqüências a longo prazo, como a dívida externa que isso causou, porque somos imediatistas e resolvemos tudo de forma paliativa)
Creio que, no nosso caso, contentamo-nos com muito pouco. Já diria o clichê: "o inimigo do ótimo é o bom." Se na Europa o político precisa ter muita força para manipular as massas, no Brasil nos contentamos com um estádio de futebol e um auxílio de bolsa alguma coisa de R$ 200 reais. Por isso, lá, teve mais revolução que aqui. O que dizer da gloriosa Revolução Francesa? E da Revolução Bolchevique? E os camponeses anabatistas alemães? Aliás, a própria Reforma Protestante foi uma revolução. Os Estados Unidos conquistaram a independência com guerra. E nós não temos revolução na nossa História. A não ser os eufemismos que damos para os nosssos eventos: O "Golpe Militar" é chamado de "Revolução Democrática". Mas nada é pior que rótulo e generalizações. Não podemos colocar o Brasil todo em um saco só. Alguns pontos isolados fizeram sua revolução, como a gloriosa revolução paulista de 1932 contra a ditadura do populista Getúlio Vargas. Pena que restringe-se a um grupo tão pequeno: de 27 estados, não chega a 5 os que fizeram algum movimento em 500 anos de História!Lastimável e Patológico sim.

Peroratio disse...

Ora, ora... você começa negando a patologia, e termina com ela, depois de um louvor ao "glorioso" movimento paulista de 32...

Política é um problema. E vemos as coisas a partir da posição política em que nos colocamos. Não vejo a "bolsa" com a visão engaqtiva que você demonstra. Épreciso precisar dela para saber seu valor. E, acredite, milhões de brasiliros literalmente precisam dela. E, certamente, isso nada tem a ver com "comodismo", porque, nos 500 anos de istória de acomodação de osso povo, em menos 3% dela se usou o "expediente" da "tal bolsa".

Ah, e mudando de assunto, em termos históricos, há evidência a respeito do "infanticídio" de Herodes?

João Oliveira Ramos Neto disse...

"Política é um problema. Vemos as coisas a partir da posição política em que nos colocamos." A escrita também é um problema. Pois o leitor pode perceber coisas nas entrelinhas e compreender o autor de forma equivocada. Vamos lá:
1. Hora nenhuma eu neguei a patologia no comentário acima.
2. Eu assumo que fui totalmente tendencioso com a minha referência à revolução paulista sem problemas! rs...
3. O fato de dizer que nós brasileiros nos contentamos com pouco não significa que eu seja contra a bolsa. Eu sou anti-neoliberalismo (neste caso, estamos falando do liberalismo político-econômico e não teológico, rs...) e anti-PSDB e anti-DEM. Leia sobre isso no meu blog. O Brasil precisa sim de obras assistenciais. Sou 100% Lula e se ele candidatasse de novo, eu votaria nele pela terceira vez. A questão não é essa. Não disse que não devemos ter bolsas. Só quis dizer que nos contentamos com pouco. Não quis colocar a bolsa como algo negativo, mas é que, seja bolsa, seja construção de estádio, seja a vitória na Copa, qualquer felicidade, por mais efêmera que seja, é suficiente para não nos rebelarmos. Em Goiânia, por exemplo, bastou pintar os ônibus e colocar ar-condicionado em 10% da frota que ninguém questiona o fato de ficar 1 hora esperando no ponto.
4. Sobre o infanticídio de Herodes, em termos históricos, a principal evidência é o próprio relato bíblico, que não deixa de ser um documento histórico. Além do fato de ter sido uma prática comum entre os governantes antigos.

Peroratio disse...

Começo pelo fim.

Documento histórico é um hiperônimo dentro do qual cabem inúmeros tipos. Um texto que mistura profecia zoroastriana assumida pelo judaísmo-messiânico, tradição polêmica, Império Romano e tradição cristã precisaria ser olhado com olhos mais céticos. Em tese. Eu diria assim: sem outras evidências, não apostaria no "evento" como histórico. Em todo caso, se um Herodes acreditasse na história toda, não desacreditaria, eu, que ele fosse capaz de algo assim.

Hum, você se confessa esquerdista. Mas, cá entre nós, seu post dificilmente o denunciaria. Pelo contrário! No mesmo parágrafo você faz um comentário um tanto depreciativo da bolsa "petista" e o coroa com um elogio ao movimento paulistano de 32... Eu tinha que ser adivinho para interpretar que era um esquerdista escrevendo...

Quanto a negar a patologia. O modo como você introduziu o texto, negava, sim: "não é necessariamente patológico", você disse... De fato, em si, a sintaxe não nega. Mas, some-se a ela o fato dos indicativos que soam como de direita, e... Mas, no final, você acabou concordando. O início e o meio ficaram como um ruído. O final, então, constitui uma síntese de sua idéia - e essa eu captei...

Afinal, é ou não é patológica a "pasmaceira" nossa? Essa dos ônibus que você contou é sintomático...

João Oliveira Ramos Neto disse...

Eu prefiro começar do começo.

1. "Documento histórico é um hiperônimo dentro do qual cabem inúmeros tipos." De onde você tirou isso?

2. "Um texto que mistura profecia zoroastriana assumida pelo judaísmo-messiânico, tradição polêmica, Império Romano e tradição cristã PRECISARIA ser olhado com olhos mais céticos." Por quê?

(Bom, estou sendo audacioso aqui. O acadêmico sou eu, portanto eu é quem preciso embasar as minhas afirmações. Você já é doutor, pode fazer a afirmação que quiser, como disse aquela sua amiga! rs...)

3. "No mesmo parágrafo você faz um comentário um tanto depreciativo da bolsa "petista" e o coroa com um elogio ao movimento paulistano de 32... Eu tinha que ser adivinho para interpretar que era um esquerdista escrevendo..." De onde você tirou que eu me referia à bolsa "petista"? Você deu uma de sacerdote agora e fez uma inserção no meu texto! rs... Quando eu fiz um comentário pejorativo sobre a bolsa, não me referi à do PT. Vejo o "bolsa família" como algo legítimo e necessário. Agora, as bolsas que o PSDB dá em Goiás, estas sim, são de lascar. Ao invés do governo investir na UEG, ele dá bolsa para as pessoas estudarem nas porcarias da vida! E o povo adora! Eu sempre fui de esquerda, antes de fazer História. Aliás, eu escolhi fazer História por ser de esquerda, e não o contrário. Morte aos neoliberais, com suas privatizações. Não suporto o PSDB. Leia o texto "contra a alienação política" no meu blog. Aliás, eu adorei o seu vídeo em que o Serra é comparado ao Hitler. Mandei um e-mail para um monte de gente falando dele... (Engraçado, os e-mail´s que eu elogio ninguém te encaminha, né?)


4. Osvaldo, onde que eu disse "não é necessariamente patológico"? Veja bem o que eu disse: "O fato de que outras nações também são acomodadas não significa que acomodar-se não seja patológico." Parafraseando: Acomodação é sempre patológico, ainda que as nações do Primeiro Mundo também sejam acomodadas. Entendeu?

5. Por fim, nossa acomodação e alienação política é patológica sim. A acomodação política é patológica, seja aqui ou em qualquer outro lugar do mundo. A questão é que existem vários níveis de acomodação. O povo americano é muito mais acomodado que o povo francês ou o povo alemão. O povo brasileiro é muito mais acomodado que o povo chileno. E o povo goiano é muito mais acomodado que o povo carioca ou paulista.

Em 2002, começou o transporte alternativo em Goiânia. Era muito bom para o povo. Mas o coronel do transporte mandou acabar. E o prefeito obedeceu e retirou todas as vans das ruas. Alguém reclamou? Não. Todos voltaram a esperar uma hora no ponto de ônibus. Calados.

Quando eu morava no Setor Universitário, perto do Haroldo Reimer (inclusive às vezes eu vejo ele na CARA vídeo) e pegava o 020 pra ir à Igreja no domingo à noite, era o inferno. Um dia, estava tão cheio que um rapaz ficou preso na porta. Qual foi a reação dele? Achou engraçado e ficou rindo, enquanto o povo batia na lataria do ônibus para o motorista abrir.

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